Sarna em geral
Com o nome acima são descritas várias moléstias causadas por parasitas que vivem na pele dos animais, portanto ectoparasitoses; algumas ocorrendo exclusivamente em animais, outras tanto em animais como no homem sendo estas últimas portanto, típicas zoonoses parasitárias, da qual é exemplo a Escabiose, causada pelo Sarcoptes scabiei.
No gênero Sarcoptes foram já descritas as espécies abaixo, que parasitam diferentes grupos de animais, porém a especificidade de cada espécie do parasita não é estrita à espécie em que é parasita habitual, podendo serem encontrados indistintamente parasitando outras espécies animais, o que é facilmente observável em jardins zoológicos, onde coabitando o mesmo local diferentes espécies animais, tais parasitas quando ocorrem, facilmente são transmissíveis à outras espécies de hospedeiros para os quais não são habitu-almente parasitas.
Parasitando Ruminantes: | Sarcoptes bovis – Sarcoptes ovis Sarcoptes caprae – Sarcoptes rupicaprae |
Parasitando Suínos: | Sarcoptes suis |
Parasitando cavalo: | Sarcoptes equi |
Parasitando carnívoros: | Sarcoptes cani e Sarcoptes scabiei |
Parasitando coelhos: | Sarcoptes cuniculi |
Parasitando roedores: | Sarcoptes anacanthos |
Quando se estabelecem esses ácaros na pele do hospedeiro, inicialmente perfuram e eliminam as escamas da camada córnea superficial da epiderme, e a través dos extratos seguintes da pele, denominados lúcido e granuloso, chegam ao extrato espinhoso, onde situam-se os vasos linfáticos; Nesse caminho, a secreção salivar do parasita dissolve a queratina que dá resistência à camada superficial córnea da pele; Estabelecem-se os parasitas em geral no estrato espinhoso da epiderme, ali pondo seus ovos; A camada mais profunda da epiderme, denominada germinava, responsável pela regeneração da pele, reveste nessa fase, os trajetos perfurados pelo ácaro, com uma parede cornificada, provocando assim esfoliação das camadas superiores; Novas lâminas de camada córnea são geradas em reação defensiva frente aos ácaros, aos quais tenta o organismo bloquear, resultando disso tudo maior vascularização da epiderme, e conseqüente rubor e calor, o que vem se constituir no chamado Postulado de Vischow: rubor , calor e dor – constitutivos da inflamação.
Dos três sintomas acima, o primeiro (rubor) é conseqüente do aumento da circulação sangüínea no local, a qual por sua vez provoca aumento também da temperatura localizada (calor), e ambas sinergicamente, responsáveis pela sensação dolorosa que se estabelece, determinada pela compressão de terminações nervosas pelo inchaço localizado.
Virchow foi o patologista que estudando as inflamações em geral, descreveu os sinais que acompanham as diferentes fases das mesmas, assim instituindo o que hoje é conhecido por Postulado de Virchow.
Com a penetração do parasita a traves da epiderme são levados germes existentes normalmente em sua superfície, assim como no corpo dos próprios invasores para as camadas mais profundas da pele, e assim infeções secundárias se estabelecem nesse local, pondo de alerta as defesas naturais do organismo parasitado, que agora passa a combater não apenas um invasor parasita, mas também um invasor bactéria ou fungo, e assim vão as coi-sas se complicando para o organismo parasitado, que caso vença a guerra, pois trata-se de verdadeira guerra para sobrevivência de uma das partes, sobrevem cura da infeção e do parasitismo, ou caso contrário, morte do hospe-deiro, e com isso também do parasita. Algumas vezes se estabelece verdadeiro equilíbrio entre os exércitos em luta: O parasita se contentando em pa-rasitismo apenas parcial e o organismo parasitado cercando com suas defesas naturais o invasor-parasita, e assim estabelecendo-se harmonia entre as partes, ou co-existência tolerável por mútuo interesse.
O sarcoptes pode espalhar-se por toda a superfície da epiderme de seu hospedeiro, porém certas regiões são respeitadas pelo parasita, tais como a base da crina no cavalo, base da cauda e zonas de flexão de algumas ar-ticulações dos membros locomotores, por razões ainda desconhecidas.
A partir de 50-100 ovos postos por fêmea do parasita, com tamanho de 150X100 micra, nascem após 12 dias as larvas, as quais em quatro dias se convertem em ninfas, estas sofrendo uma ecdise (muda de pele) se são machos, e duas ecdises se fêmeas; Parte delas realizam então a primeira cópula, e ao fim de 7-12 dias se transformam em ácaros adultos, capazes de re-petir novamente novo ciclo biológico. O desenvolvimento completo do parasita depende da temperatura e da umidade em que os mesmos se encontrem, e leva em torno de 2-3 semanas. Há uma relação de 1 macho para cada 2 fêmeas mais ou menos constante durante o parasitismo, e sua vida dura em torno de 3 a 6 semanas para a fêmeas e 5-6 semanas para os machos. Já fora de organismos, em vida livre, sua vida não ultrapassa 3-4 semanas e tanto mais breve quanto mais seco o ambiente. Alguns dias após seu nascimento, as larvas abandonam as galerias em que nasceram, o que acontece também com os machos, e algumas vezes o mesmo acontecendo com as ninfas, migrando todos para a superfície da pele, o que sob o ponto de vista terapêutico é importante, devido tornar mais fácil e eficiente o tratamento quando realizado por aplicações externas sob forma de pomadas ou aerossóis. Já as fêmeas, continuando nas galerias profundas, não serão passíveis da ação dos medicamentos que não tenham poder de penetração até esses locais, como é o caso das pomadas tópicas ou aerossóis.
Os conhecimentos anteriormente relatados a respeito dos hábitos biológicos do parasita, permitem inferir sobre a estratégia a ser adotada para o combate do parasitismo e dos seus agentes causais, esses mesmos parasitas.
Assim, a medicação a ser instituída para o combate dos mesmos, deve se processar em duas frentes: medicação que seja eficiente e mortal sobre as formas de localização mais superficial, a través de aplicação sobre a pele, e medicamentos de ação dita sistêmica, que tenha ação sobre as formas de localização profunda da epiderme, e portanto de aplicação forçosamente oral ou injetável; Todos esses medicamentos, não obstante, devem ser inócuos ao hospedeiro parasitado, sob pena de matar-se além dos parasitas também o organismo parasitado .
Merece ser lembrada apenas como de valor histórico, a chamada Pomada de Helmerich – cuja base, o enxofre, foi um dos primeiros medicamentos instituídos no combate às sarnas.
Ainda tem seu lugar como sarnicida, o elemento químico enxofre, porém sob a forma de enxofre nascente, obtido por um artifício terapêutico, por aplicação de duas soluções: a primeira delas: solução à 40% de hipossulfito de sódio, seguindo-se após alguns minutos da aplicação de solução fraca, de ácido clorídrico à 4%, ambas no local onde situam-se os parasitas; A segunda solução (ácido clorídrico ) reagirá quimicamente com o hipossulfito, dando origem ao enxofre nascente, que tendo ação sarnicida, provocará a morte dos ácaros parasitas que se encontrem no local tratado.
Modernamente são prescritos medicamentos de aplicação local, a base de benzoato de benzila, que mata as formas superficiais do parasita, e quimioterápicos ativos contra o ácaro de localização profunda, alcançados por aplicação injetável. Entre estes últimos destacam-se o Neguvon e o Assuntol quimioterápicos comerciais eficientes contra as sarnas em geral, além de ativos também contra outros insetos e ectoparasitas.
Apenas a título informativo, esclareço que as espécies de sarnas em seguida relatadas, tem hospedeiros exclusivos, que são habitualmente animais, ou então do caso da primeira citada, que é parasita também exclusivo do homem e não transmissíveis aos animais, e que no caso especial não representa para o homem risco à sua saúde, mas apenas de efeito anti-estético.
1 – Demodex foliculorum – Parasita exclusivo do homem
2 – Demodex canis – Parasita exclusivo de cães, e excepcionalmente alguns outros animais; É de tratamento difícil, devido sua localização profunda; Requer para sua erradicação do animal parasitado, associação de dois medicamentos, um de ação superficial como o neguvom, e um segundo medicamento de ação sistêmica aplicado via parenteral mediante cuidados especiais de dose, o que portanto requer cuidado de um profissional competente.
3 – Família Trombidiidae – Importantes, por serem hospedeiros de Richetsias.
4 – Gênero Psoroptes – Ácaros grandes, parasitas de animais.
5 – Gênero Chorioptes – Parasitas de animais, exclusivamente.
6 – Gênero Otodectes – Parasitas em geral da região das orelhas, em animais.
7 – Gênero Cnemidocoptes – Originariamente parasitas de animais.
8 – Gênero Notoedres – Normalmente parasitas de gatos e outros felideos.
9 – Gênero Tyroglyphus – Normalmente parasitas de alimentos, principalmente cereais, e mesmo queijos.
(Médico Veterinário - CRMV-SP-0442)
São José do Rio Preto - SP