Saúde Animal

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Epilepsia: Procedimentos Clínicos




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Introdução

O paciente convulsivo é sempre um desafio na Clínica de Pequenos Animais, não só diante da dificuldade no estabelecimento de um diagnóstico etiológico, mas também, pela ocorrência elevada de casos clínicos. Goste ou não da Neurologia, o veterinário deverá ter conhecimentos básicos para encaminhar corretamente estes casos que encontra com elevada freqüência em seu consultório.

O diagnóstico

Quase sempre o animal é atendido no interstício entre uma crise e outra. Neste período, a despeito do leigo pensar que o quadro clínico do animal não tem valor diagnóstico, é de fundamental importância o exame clínico e neurológico do paciente. É nesta ocasião que se deve investigar a ocorrência de outros sintomas neurológicos ou extra-nervosos. Se entre as crises não se verificam outras anomalias e isto deve ser constatado em mais de um exame, provavelmente, estamos diante de um caso de Epilepsia Verdadeira. Deste modo, o diagnóstico clínico passa a ser por exclusão. Deve-se também, considerar as raças envolvidas e a idade do animal na ocasião do surgimento das crises. Em nosso meio, as raças mais acometidas são: o Pastor Alemão, o Poodle, o Husky Siberiano e o Dachshund, todos com predisposição genética. Decerto, estes animais não deveriam mais se reproduzir, entretanto, na realidade não é isto que ocorre. Quando o animal não apresenta crises convulsivas em razão da eficiência na medicação, o proprietário “esquece” que seu animal é epiléptico. Temos visto em nossa prática clínica que estes animais quase sempre estão próximos aos 2 anos de idade. Acontecem casos em idade um pouco mais avançada, bem como, antes dos 2 anos, entretanto, não são os mais freqüentes. A história revela que nestes casos de Epilepsia Verdadeira, a crise convulsiva, com freqüência, ocorre quando o animal está dormindo ou em repouso, ou seja, sem um fator desencadeante aparente.

Diagnóstico diferencial

Uma das maiores causas de fracasso na terapêutica da epilepsia é o diagnóstico equivocado. Há outras causas de convulsões que mimetizam o quadro clínico da Epilepsia Verdadeira. As principais são as alterações estruturais do cérebro: as neoplasias sempre devem ser consideradas, especialmente, quando além da refratariedade ao tratamento convencional, o quadro neurológico for progressivo. O exame do paciente entre as crises convulsivas deverá revelar outras alterações nervosas. Nestes casos, a tomografia computadorizada, apesar de ainda ser um exame custoso, poderá realmente ser de valor. Ainda em nosso meio, as seqüelas do vírus da cinomose dos cães (VCC) também devem ser consideradas, entretanto, depois da doença ativa, o quadro clínico deverá ser estável, não progressivo, a despeito de outras alterações nervosas: a lesão pelo VCC é multifocal na grande maioria dos casos. A história clínica aliada aos exames sorológicos deverão esclarecer o diagnóstico.

Outras causas de epilepsia sintomática de menor importância clínica deverão ser consideradas, tais como: insuficiência cardíaca, hipoglicemia e outros distúrbios metabólicos, especialmente, a hipocalcemia puerperal, tão freqüente na cadela e inconfundível. Os envenenamentos, principalmente, pelo fluoracetato de sódio (chumbinho) também devem fazer parte do diagnóstico diferencial, desde que, exigem procedimentos clínicos diferentes.

Tratamento

Nos casos de epilepsia sintomática o tratamento deverá ser dirigido para a doença primária, a despeito de que, em alguns casos, como os tumores cerebrais, o tratamento clínico paliativo com anti-convulsivantes poderá ser necessário. Nos casos de Epilepsia Verdadeira há duas situações a considerar:

1º caso: O animal é atendido em crises convulsivas (Estado epiléptico) – nestes casos urge sedar logo o animal. O primeiro medicamento a ser empregado, em razão de seu custo, facilidade de aquisição e, principalmente, por sua segurança, é o diazepam (Valium ® ). Nós o utilizamos na dose de 0,5 mg/Kg de peso vivo, sem ultrapassar a 10 mg em cada aplicação, sempre por via endovenosa, em até três vezes, com intervalos aproximados de 30 minutos. Se isto não for suficiente para cessar as crises convulsivas, utilizamos então o Pentobarbital Sódico na dose de 5 a 10 mg/Kg de peso vivo, também por via endovenosa. Vale lembrar, que nesta altura dos acontecimentos, o paciente já deverá estar anestesiado, sendo importante a intubação e o fornecimento de oxigênio, a fim de garantir sua ventilação. Na maioria das vezes, isto deverá ser suficiente para afastar o risco de novas crises convulsivas, entretanto, em alguns poucos casos, poderá ser necessário a utilização de anestésicos voláteis. Em razão da depressão cardiovascular e respiratória que causa, além da dificuldade na sua aquisição, na prática clínica nós não temos utilizado o fenobarbital injetável. A fim de se evitarem as seqüelas, para os animais com convulsões contínuas e que persistiram por mais de 30 minutos, será preciso tratar também do edema cerebral secundário.

2º caso: O animal é atendido sem crises convulsivas – para estes casos, bem como, para àqueles que saíram do estado epiléptico, é preciso implantar uma terapêutica anti-convulsivante profilática, lembrando que a mesma não poderá ser suspensa na Epilepsia Verdadeira, sob o risco de novas crises convulsivas intratáveis. Neste momento, devemos recordar que alguns pontos são de máxima importância e alguns deles, deverão ser esclarecidos com o cliente, que dentro do possível, deverá conhecer bem o problema, a fim de tomar as providências necessárias para o sucesso do tratamento.

a) O arsenal farmacêutico para o tratamento da epilepsia do cão é pobre. Contamos apenas com duas ou três drogas comprovadamente eficientes. Desta forma, antes de se pensar em mudar um medicamento, este deverá ser completamente esgotado no que diz respeito a dose e posologia, bem como, em associação com outras drogas que possam potencializar seus efeitos.

b) O fenobarbital é a droga de eleição para o tratamento da epilepsia verdadeira do cão. A dose varia grandemente, segundo a literatura, mas nós o utilizamos de 2 a 6 mg/kg por via oral. A princípio, a posologia ideal deverá ser a cada 12 horas.

c) Os brometos de sódio ou de potássio poderão ser empregados isoladamente ou em associação com o fenobarbital, para potencializá-lo. A dose é de 25 mg/kg por via oral e a posologia também é a cada 12 horas.

Causas de falhas no tratamento

São muitas, mas as principais são:

1º) Suspensão da medicação pelo profissional ou pelo proprietário em casos de Epilepsia Verdadeira;

2º) Posologia errada: com freqüência se utiliza o fenobarbital a cada 24 horas;

3º) Utilização de outros medicamentos de uso humano, ineficazes para prevenir as convulsões no cão: os mais comuns são: difenilhidantoína; Tegretol ®; Rivotril ® e Depakene ® .

4º) Diagnóstico equivocado: principalmente nas epilepsias sintomáticas, com o quadro clínico progressivo;

5º) A despeito do sucesso em muitos pacientes, em cães da raça Pastor Alemão há casos de Epilepsia Verdadeira refratários aos tratamentos clínicos conhecidos e, quase sempre, terminam em eutanásia à pedido do proprietário.

Observações finais:

• O paciente que recebe fenobarbital há mais de um ano, deverá ser acompanhado para o possível desenvolvimento de lesão hepática.

• Muita pesquisa está sendo desenvolvida em busca de novas drogas, mais eficazes e menos tóxicas, para o tratamento preventivo da Epilepsia Verdadeira no cão. Recentemente, foi liberado nos EUA e já se encontra disponível no Brasil, a gabapentina, contudo, ainda não temos experiência suficiente para comentar seus efeitos, exceto que, é um produto bem mais caro que o fenobarbital.

Literatura recomendada:

BOOTHE, D.M. 1994. El tratamiento anticonvulsivo en los pequenos animales. Waltham Focus , 4 (4): 25-31.
FREY, H.H. 1989. Anticonvulsant drugs used in the treatment of epilepsy. Probl. Vet. Med., 1 (4): 558-577.
PODELL, M. & FENNER, W.R. 1993. Bromide therapy in refractory canine idiopathic epilepsy. J. vet. Intern. Med., 7 (5): 318-327.
SCHWARTZ-PORSCHE, D. 1999. Un enfoque sobre el diagnóstico de las convulsiones. Parte 2: Procedimientos diagnósticos. Waltham Focus , 9 (1): 9-15.

Dr. Luiz Felipe Castro Graeff Vianna
Professor Titular de Clínica Médica Veterinária, UFRRJ, PhD