Comer também é uma forma de expressão: um olhar para o comportamento alimentar de cães e gatos
Já conversamos bastante por aqui sobre as diferenças comportamentais de cães e gatos e chegamos até mesmo a bater um papo sobre o que podemos aprender com essa diversidade. Quem já teve (ou ainda tem) a oportunidade de dividir o espaço com ambas as espécies sabe quanto aprendizado a gente pode ter com cada uma delas, não é mesmo?
Também já falamos, de passagem, que estas diferenças incluem a alimentação… mas, hoje, quero falar um pouquinho mais detalhadamente sobre isso.
Muitos tutores dizem ao colocar a comida para o cão na frente de amigos:
– Que vergonha! Você o vê assim e pensa que eu não dou comida pra ele, né? Ele é esfomeado! Ponho a refeição e ele devora tudo.
Então, vamos entender a essência da sua vergonha?
Brincadeirinha! Vou melhorar… Vamos compreender esse comportamento do cão?
Na natureza, os ancestrais dos cães domésticos, os lobos, costumam caçar em matilhas e se alimentar de pequenos animais e também de partes de plantas. Estas sociedades são caracterizadas pela presença de um animal dominante, denominado alfa, em torno do qual vão se dispondo os demais membros: quanto mais próximo está do alfa, maior é a importância social do membro. O “líder” do grupo tem a preferência: é ele quem se alimenta primeiro e os demais animais vão se alimentando de acordo com a hierarquia social. Assim, eles têm o hábito de consumir o alimento de uma vez. Se há mais de um cão em uma casa, por exemplo, é natural que a presença de um estimule o consumo do outro. Cães também são neófitos, ou seja, em condições de conforto costumam aumentar a ingestão quando um alimento novo é oferecido (mas é claro que este comportamento é influenciado pela palatabilidade do alimento). Eles também preferem horários regulares para as suas refeições. De forma geral, é recomendado dividir a quantidade diária de alimento que eles devem consumir em duas porções diárias (para os adultos) e três (para os animais em crescimento). O melhor é deixar essas refeições a disposição por 15 minutos e depois retirar as sobras (quando sobrar). Cães são, por isso, frequentemente definidos como glutões.
Agora, se os tutores de cães falam da voracidade, você que tem um gatinho em casa deve ter comentado:
-Ah, meu gato é exigente! Cheio de manias. Cheira a ração antes de comer, olha, dá uma voltinha, retorna, escolhe os grãos que vai comer, tira alguns da tigela e joga no chão, come uns três grãos e aí vai tirar uma soneca… Depois, acorda, dá aquela espreguiçada e volta para comer mais uns grãozinhos…
É assim? Bem, na natureza os pequenos felinos (ancestrais dos gatos domésticos) são caçadores solitários e são estritamente carnívoros. Eles chegam a caçar 8 a12 pequenos camundongos para suprir suas necessidades energéticas diárias, ou seja, para comer tudo o que precisa por dia ele precisa fazer várias caças e isso é feito aos poucos. É por isso que os gatos domésticos são petiscadores, isto é, fazem pequenas refeições ao longo do dia. Por isso, a quantidade recomendada diária deve ser mantida a disposição do felino durante o dia todo e restrições de horário podem fazer com que ele coma menos. Eles também costumam ser neófobos (não gostam muito das trocas constantes de alimentos).
Agora, por que ele tira o alimento do potinho? Gatos não gostam de encostar os seus bigodes (pêlos táteis) nas bordas do recipiente e costumam comer mais o que está no centro. Eles podem achar formas melhores e criativas para comerem o que fica mais na borda ou mesmo para não encostarem os seus bigodes em potinhos estreitos demais… Espertos, não? De qualquer forma, use sempre potes de bocas mais largas para os bichanos… Isso os ajudará bastante! Eles agradecerão!
Viu só como a forma como nossos amigos comem pode dar muitas pistas sobre as suas preferências? É só ficar de olho!
Médica Veterinária, Dra. em nutrição de cães e gatos