Complicações Pós-implante de Transponder
(“MICROCHIP”) EM (SPIX, 1824)(Reptilia; Testudinata)
INTRODUÇÃO
A microchipagem de animais no Brasil é uma atividade recente e sua obrigatoriedade no tocante a determinadas espécies de animais silvestres nascidos em cativeiro, cujo objetivo seja comercial, a torna um elemento de poucos parâmetros tanto à nível de escolha mais adequada do local do implante do transponder, como também dos possíveis problemas gerados pela sua má colocação ou contaminação.
O comércio legalizado de animais silvestres nascidos em cativeiro é uma atividade muito difundida em diversos países, que gera milhões de dólares e uma gama gigantesca de profissionais envolvidos em todo o suporte técnico. Cada país possui uma legislação específica que regulamenta a criação e o comércio. A legislação brasileira que permite a criação comercial e a venda de exemplares considerados “silvestres”, esta prevista em duas portarias do IBAMA (INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS).
No caso de répteis o único sistema possível, à exceção aos quelônios aquáticos de médio e grande porte que utilizam lacres presos às nadadeiras, é o transponder ou “microchip”. Cada “microchip” possui um número específico que é gravado no momento de sua fabricação. Esta numeração é inviolável e imutável. Resumidamente o microchip nada mais é que um circuito de computador medindo 11,2 mm de comprimento por 1,2 mm de circunferência, o qual é implantado com auxílio de agulha hipodérmica, sendo de material inerte e biocompatível, funciona como uma antena que ao receber uma quantidade de ondas de rádio geradas por um sensor específico conhecido como leitor, “reflete” informações pré-determinadas na sua confecção.
A exigência de um sistema individual de marcação é restrito à legislação brasileira. Uma das razões de sua não obrigatoriedade em outros países é que, dependendo da espécie, ela simplesmente torna inviável o implante e o próprio comércio em si. Devemos ter em mente que o principal alvo do comércio de qualquer espécie, tanto à nível comercial quanto de aquisição, é evidentemente a procura por filhotes. Nos anfíbios é impossível a marcação de filhotes e no caso dos répteis, tema aqui abordado, o implante do “microchip” fica limitado a determinadas espécies e consequentemente a um tamanho específico, muitas vezes inviável a filhotes com menos de uma ano de vida.
O presente artigo descreve dois casos clínicos provindos de um montante de 450 unidades de jabutis da espécie Geochelone carbonaria que foram comercializados ao longo de um ano. Destes cerca de 2 a 3% dos indivíduos manifestaram problemas posteriores oriundos da microchipagem.
A segurança, eficácia e utilização do transponder não é aqui discutida pois sua excelente capacidade de individualização (leitura da numeração) e baixíssimos riscos de rejeição por si só revelam seus benefícios. Apresentamos alguns quadros clínicos decorrentes de contaminação, possivelmente ocorridos durante ou imediatamente após o implante destes microchips.
Em nossa casuística no recebimento destes animais de criadores autorizados, verificamos problemas relacionados na microchipagem como abcesso e exudato caseoso no local do implante do microchip, hiporexia e nos casos mais severos anorexia e pneumopatia secundária diagnosticada pela sintomatologia clínica confirmada por imagem radiográfica e cultura das secreções. Como a utilização de “microchip” em filhotes de répteis é pouco utilizada em outros países, a atual legislação brasileira transformou o mercado de animais silvestres num grande laboratório experimental. Pouco sabe-se sobre as possibilidades de migração ou de possíveis futuros comprometimentos decorrentes do implante em animais tão diminutos. Com certeza o principal problema não reside no transponder em si, uma vez que é biocompatível e sem sinais de rejeição, mas sim nas dificuldades de seu implante e nos riscos de contaminação no primeiros dias após seu recebimento.
MATERIAIS E MÉTODOSForam utilizados 3 animais , os quais denominaremos de paciente A, B e C com idade aproximada de 1 ano. Os animais em estudo pertencem ao gênero Geochelone carbonaria. Os pacientes pesaram entre 54 gramas e 67 gramas.
Cada paciente foi examinado minuciosamente sendo que o paciente A apresentava-se anorético, prostrado, secreção nasal bilateral mucosa, secreção ocular bilateral mucosa com os olhos cerrados, emaciado e abscesso caseoso em região inguinal esquerda.
Os pacientes B e C apresentavam-se ativos, hiporéticos, ligeiramente emaciados e abscesso caseoso em região inguinal esquerda.Os pacientes foram submetidos a cultura para fungos, cultura para bactérias e antibiograma das secreções.
PREPARAÇÃO DOS ANIMAIS
Das lesões observadas na pele foram coletadas amostras com auxílio de swab estéril e em seguida semeadas em meio ÁGAR-SANGUE e MACONQUI para observação de crescimento bacteriano.
Foi realizado também cultura para fungos das lesões observadas na pele, coletando as amostras com auxílio de swab estéril e em seguida semeadas em meio MICOBIOTIC + SABOURAUD.
RESULTADOS
MATERIAL: secreção pele
Paciente A: Proteus sp e Escherichia coli Paciente B: Staphylococcus epidermidis e Corynebacterium sp
Paciente C: Escherichia coli
ANTIBIOGRAMA / TABELA:
ANTIBIÓTICOS | A1 | A2 | B1 | B2 | C | |
Amicacina | S | S | S | S | S | |
Amoxicilina e Ac. Clavulônico | N | N | S | S | S | |
Ampicilina | R | R | S | S | S | |
Ceftiofur | S | S | S | S | S | |
Cefalexina | N | N | S | S | S | |
Cefalotina | N | N | S | S | S | |
Cefotaxime | S | S | N | N | N | |
Cefadroxil | R | R | N | N | N | |
Cloranfenicol | S | S | S | S | R | |
Doxiciclina | S | N | N | N | R | |
Enrofloxacina | S | S | S | S | S | |
Gentamicina | S | S | S | S | S | |
Neomicina | S | R | S | S | S | |
Norfloxacin | S | S | S | S | S | |
Penicilina G | N | N | S | S | R | |
Polimixina B | R | S | S | S | N | |
Sulfametoxazol e Trimetoprim | S | R | S | S | S | |
Tetraciclina | S | R | S | S | R |
A1= paciente A / Proteus sp
A2= paciente A / Escherichia coli
B1= paciente B / Staphylococcus epidermidis
B2= paciente B / Corynebacterium sp
C= paciente C / Escherichia coli
S= Sensível
R= Resistente
N= Não testado
O resultado das culturas para fungos foram negativas.
CONCLUSÃO
Os resultados apresentados demonstram uma grande variedade de bactérias patogênicas acometendo o local de implante do transponder. O crescimento destas bactérias nos meios de cultivos apropriados sugerem contaminação intensa no local da implantação do microchip provavelmente devido a ausência de condições higiênicas básicas requeridas para qualquer procedimento invasivo. Devemos lembrar que Répteis são animais rastejantes e esta proximidade ao solo, tornam extremamente problemáticos as medidas profiláticas de contaminação pós-implante, uma vez que defecam e urinam, muitas vezes, sem sair do lugar, contaminando facilmente toda a área.
A ausência de trabalhos específicos nesta área, razão pela qual não apresentamos referências bibliográficas, refletem que em muitos casos a grande quantidade de bactérias patogênicas encontradas no local da implantação do transponder, microchipagem em locais inadequados e a utilização de técnicas inadequadas anti-sépticas ou até mesmo a não utilização das mesmas na região escolhida, pode dever-se ao simples fato do desconhecimento de normas ou regras básicas para a implantação deste meio de identificação tão importante e acessível aos médicos veterinários e criadores autorizados pelo IBAMA.
Médico Veterinário - CRMV/SP: 8621
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